Parte 6. Nem dia nem noite
Ainda não era demasiado tarde.
As janelas se fecharam
As ruas ficaram subitamente quietas
Os carros vieram
E espalharam ciscos, gravetos
Pela rua Acre, naquele fim de tarde.
Pigmentada no céu
Havia uma cor intensa
vista pelo bairro inteiro,
Uma cor daquela
Para os lados de Planalto
Após a linha
Após o trem passageiro passar
Apitando, como uma flecha
Em direção a Murutinga
Valparaíso, Bauru
(E o bando de meninos
Correndo atrás, atirando pedras
Vendo as pequenas cabeças atrás da janelas;
Vendo as pequenas silhuetas
Sentadas e ficando pequeninas, pequeninas
Perdendo-se na linha do ocaso).
Mas está ficando tarde
E toda a solidariedade do mundo
Escreve-se ali entre a poeira
Escreve-se nos barulhos de pratos
Chamados de cachorro
Chamados de criança
(fulano, vem aqui menino!)
a vida do bairro explodindo
E o momento parece um quadro
uma pintura em ouro fresco
naquele janeiro ou fevereiro
tão direto, tão verdadeiro
que dilacerava os olhos.
Era tão direto
Tão infinitamente claro
Que até hoje a imagem, o desenho
Ainda se descobre
Em meu peito
- Uma marca de homem
E de esparsas feras:
Uma marca de som
Do que ainda não foi esquecido
e que permanece absolutamente
Intacto
Em alguma parte minha represada.
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