quinta-feira, abril 05, 2012

ALÉM DO PARANÁZÃO

     (Foto de Mauro Pereira da Silva - Rio Tietê, quase na fronteira entre São Paulo e Mato Grosso, nas proximidades de Itapura, quando o poderoso Tietê une-se ao Rio Paraná)



(Minha modesta homenagem a Três Lagoas e suas vizinhas:
Ilha Solteira, Itapura, Guadalupe do Alto Paraná e Jupiá)


Um grande círculo rasga o céu para os lados de Mato Grosso
Desenhos sangrando rastros na divisa do Rio Paraná,
Onde a fronteira do possível dá outra perspectiva
Lente distinta de focos e pequenas lanças projetadas
Entre pontas de arvores, pedras sinuosas e rosas.
Morreu algo, percebo, mas não defino exatamente
Se o pequeno foi engolido pelo imenso
Ou se tudo aquilo é pleno de vida, mesmo assim
Transformado em água e gravetos jogados.
Em Três Lagoas, a imagem do Cristo quer ser carioca
Braços abertos apontando a cidade plana e azul
De asfalto, de gente, de carros e burburinho.
Parece de certa forma um cais de promessas
Granjeiros, homens hirsutos com suas botas
Seus chapéus panamá e calosas mãos de trabalho.
Mas me amedrontam as tempestades deste
Centro-oeste bravio e sedutor, farto de grãos e gado.
Me amedrontam as planícies imensas de soja e pasto
As estradas que não se findam, o sol causticante
Que nos projeta em várias figuras cansadas e sedentas.
A visão que tenho não é a visão de paulista cego
Pelo asfalto e suas lamparinas fosforescentes.
Olho com os olhos de filho da terra, talvez ainda
Desconfiado diante do verde violentamente belo
E das mocinhas morenas desfilando em suas bicicletas.

domingo, abril 01, 2012

UMA VOZ

Foto de Mauro Pereira da Silva - Rio Claro - São Paulo
Fazenda dos Prados, dentro do Horto Florestal

Voltei como uma recordação na estrada.

Ela não estava mais lá.
Uma voz dentro me dizia:
Destrói teu sono, apressa-te e constrói a noite.
Mas havia uma porta corrediça e jogos,
E choro e morte e a terrível mão do tempo,

Desejei que o dia passasse, que a vertigem silenciosamente branca
Fosse depositada no assombro.
Havia uma coisa qualquer sobre a mesa.
Fiquei só e imóvel.

E ninguém, através das pontes e dos rios,
Que se fizesse sol ou porta,
Me salvou desta grande noite.

A MOÇA ATRÁS DA JANELA

Foto de Mauro Pereira da Silva - Mandirituba - Paraná

Ela não respondeu.
O prelúdio era a noite
E braços se estendiam em sacrifício pelas ruas.
Já houve um mar, há tempos,
Hoje há apenas um rio e grama,
E quedas estreitas neste mar silencioso.

Ela despencava no sagrado, bela,
Objeto do meu desejo, eu que sou
Espectador deste mundo coberto
De urzes e furacões.

Vejo-a, mas, exasperado pela sua
Pouca compaixão, jogo meu anseio
De imediato e anterior, pelo tempo,
Deliberado e intrínseco.

Um rio se alarga em meus lombos:
Um fogo queima, insone.
Uma casa impossível adormece.