Esta noite, para além das folhas projetadas
Para além das mãos que surgem em minha memória,
Para o temor de uma voz alta escondida e ligeira
Esta noite, jovem em minhas lembranças,
Agarrando uma corda, correndo atrás de uma carreta,
Afagando minha dor imperceptível em gritos.
Esta noite, deuses e sótãos, olhos e qualquer gesto
A mesa da sala abarrotada de libélulas e de céus,
Caminhantes numa estrada longe, longe,que nunca mais vi
Um silêncio de tantos anos, uma figura na rua;
Esta noite, aqui, neste bairro, nesta antiga cidade
São Paulo não mais cinza, mas que é a minha casa,
Onde envelheço e sofro como data numa folhinha antiga.
Esta noite imensa, imensa, que não me cabe,
Mas que escuto, chegando, devagarinho, por entre passos
Prédios e casas, pessoas e carros, e isso soa rude
Como fotografia de um lugar onde nunca estive,
Desenho atormentado de enormes conjecturas
Palavras hesitantes e sem fôlego mas palavras,
Tamanho é o seu desenho em minha alma
Tamanha é esta noite em sua essência e fim
Pálida, caminho calçado e aceso entre os olhos
O colorido úmido do mais profundo de mim.